Capacitando mulheres imigrantes venezuelanas no Brasil

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Antes das 8 horas da manhã, sob um sol equatorial abrasador, dezenas de mulheres imigrantes e refugiadas venezuelanas haviam se alinhado em frente à Igreja da Consolata em Boa Vista, capital de Roraima, um estado do norte do Brasil que faz fronteira com a Venezuela.

Entre elas estava Briggitte Jimenez, 49 anos. Ela chegou a Boa Vista em fevereiro de 2019, após cortes na saúde pública venezuelana nos cuidados com o câncer. Seu filho de 17 anos teve câncer gástrico e Jimenez deixou seus outros três filhos na Venezuela na esperança de salvar seu primogênito. Sozinha e incapaz de trabalhar enquanto cuidava do filho que mal estava consciente, Jimenez fazia fila ao lado das outras mulheres na esperança de receber assistência da ONU Mulheres.

Briggitte Jimenez deixou tudo o que tinha na Venezuela, na esperança de encontrar a cura para seu filho mais velho, que tinha câncer. O programa da ONU para Mulheres a ajudou quando ela estava em um momento muito desafiador de sua vida. Foto: ONU Mulheres / Felipe Abreu

Com financiamento do Fundo Central de Resposta de Emergência das Nações Unidas, a ONU Mulheres ofereceu vários serviços e treinamento de novembro de 2018 a março de 2019. Jimenez veio procurar assistência psicossocial e apoio em dinheiro. O programa se concentrou em mulheres extremamente vulneráveis, como as que vivem nas ruas, com sérios problemas ou deficiências de saúde, cuidando de um parente doente ou correndo risco de exploração e / ou tráfico sexual.

Briggitte Jimenez esperou várias manhãs antes de se tornar uma das doze mulheres examinadas e receber tratamento psicológico gratuito e ajuda financeira.

Em Pintolândia, um abrigo exclusivo para indígenas vindos da Venezuela para Boa Vista (Roraima, Brasil), a ONU Mulheres apoiou mulheres das etnias Warao e E’ñepá a terem renda própria produzindo e vendendo artesanato. Foto: ONU Mulheres / Felipe Abreu

“Este foi o primeiro apoio que tive no Brasil”, disse ela. “Eles viram meu estado emocional depressivo e o psicólogo me ajudou a deixar o buraco negro em que estava e encarar a realidade como ela é. Agora estou mais conectada à minha própria força.”

Com fé inquebrável, Jimenez cuidou do filho e conseguiu o dinheiro que recebeu para comprar comida que ele podia digerir. Ela também participou de algumas oficinas de capacitação econômica.

“Chegamos com a ideia de que chegaremos aqui, e tudo será fornecido para nós, mas isso não é verdade”, ela admitiu. “O curso que fiz com a ONU Mulheres sobre educação financeira me ensinou como economizar e usá-lo com mais sabedoria.”

O nome de Esperanza significa ‘esperança’ em espanhol. Depois de receber dinheiro de emergência e ter aulas de culinária ministradas pela ONU Mulheres em Boa Vista, suas esperanças de um futuro melhor para sua família foram renovadas. Foto: ONU Mulheres / Felipe Abreu

Realizados em parceria com a Defensoria Pública do Estado de Roraima e a Universidade Federal de Roraima, o setor privado e as agências da ONU, as oficinas alcançaram 1.148 mulheres e 177 homens. Os temas são decididos com base no que as mulheres consideram mais importantes: resolução de conflitos, qualificação profissional, empreendedorismo, aulas de culinária e artesanato e conversas com homens sobre não-violência e responsabilidades compartilhadas.

Gabriela Avila, 33 anos, instruiu Briggitte Jimenez e outras 107 mulheres sobre as habilidades que ela também precisava aprender – como economizar, gastar e investir a ajuda financeira recebida.

Nos primeiros três meses de 2019, 609 mulheres foram vistas em Boa Vista pela equipe multidisciplinar da ONU, composta por psicóloga, assistente social e advogada. Após a triagem, 67 acessaram tratamento psicológico gratuito, 77 receberam aconselhamento jurídico e 443 obtiveram dinheiro de emergência que podem gastar em suas necessidades urgentes e imediatas.

“Quando começamos a trabalhar no campo, as mulheres costumavam nos dizer que sentiam que eram ouvidas pela primeira vez desde que chegaram ao país”, diz Fernanda Givisiez, coordenadora de apoio psicossocial da ONU.

O escritório de campo da ONU para Mulheres foi aberto em Boa Vista em novembro de 2018 para trazer uma perspectiva de gênero à resposta humanitária nacional. Segundo as últimas estatísticas da Polícia Federal, cerca de 500 venezuelanos estão entrando no Brasil diariamente. O estado de Roraima registra o maior número, com 10.000, metade dos quais atualmente moram em abrigos e outros que não têm condições de alugar uma casa, moram nas ruas ou ocupam prédios abandonados.

Em Pintolândia, em um abrigo de emergência exclusivo para os grupos indígenas Warao e E’ñepá vindos da Venezuela, as mulheres também estão recebendo habilidades para aumentar a renda, como aumentar a produção de artesanato.

Depois de participar de workshops educacionais da ONU para empoderamento econômico, as mulheres imigrantes e refugiadas estão usando seus talentos para criar projetos juntos e se tornarem financeiramente independentes. Foto: ONU Mulheres / Felipe Abreu

“Estamos mostrando a cultura de nossos antepassados ​​e isso nos faz sentir mais fortes”, diz Oriana Gonzalez *, uma líder de 54 anos do Warao que ensina mulheres mais jovens a fazer cestas, chaveiros, colares, arcos e flechas.

Na migração, as mulheres enfrentam vulnerabilidades extras relacionadas à violência e exploração sexual. Quando eles chegam a Boa Vista, a maioria deles vive nas ruas até encontrar um lugar em um abrigo. Foto: ONU Mulheres / Felipe Abreu

“Nosso papel aqui é salvar a vida das mulheres”, diz Flávia Muniz, Coordenadora de Espaço Seguro para Mulheres da ONU. “E fazemos isso dando às mulheres esperança e ferramentas práticas – ajuda financeira, apoio psicossocial e jurídico, encaminhamento para serviços públicos, oficinas educacionais para desenvolver e fortalecer suas habilidades e espaços seguros para que as mulheres cuidem umas das outras.”

A ONU Mulheres também está treinando funcionários públicos sobre os obstáculos adicionais e únicos enfrentados pelas mulheres como migrantes e requerentes de asilo.

Notas

* Os nomes foram alterados para proteger a privacidade dos indivíduos.

Atualização: O filho de Briggitte Jimenez morreu alguns meses após sua chegada a Boa Vista. Ela voltou para a Venezuela, apenas para retornar ao Brasil dois meses depois – movida por fome e escassez. Ela continua a receber treinamento vocacional da ONU e está recebendo aconselhamento psicológico.

Texto traduzido e adaptado pela equipe do dicas e notícias para mulheres.
Fonte: Un women